sábado, 18 de março de 2023

Eu preciso odiar meus personagens

  Existem pessoas que escrevem aquilo que gostariam de viver. Eu escrevo sobre as pessoas que gostaria de conhecer. De certo modo, talvez isso seja um presságio de ruína. 


Não me lembro quem disse, mas uma vez eu li sobre como nossos personagens, por mais desprezíveis e e desonestos que sejam, sempre tem um pouquinho da gente. Quer tenhamos consciência disso, quer não. Aposto que Freud teria alguma teoria sobre como o jeito que eu componho meus personagens para sempre serem remediáveis, na verdade tem muito a ver com a minha crença interna de que sou sempre, eu mesma, remediável. Mas ele não está aqui. E acho justo dizer que tenho uma birra  dele desde que, com 12 anos, eu li que ele achava que os defeitos que nos irritavam nas pessoas, na verdade eram os defeitos que reconhecíamos na gente também. 

Eu sempre gosto dos personagens que crio. Me imagino tomando café ou fazendo caminhadas pelos bairros mais confusos da minha cidade com todos eles. Até quando me irritam. Até quando simplesmente não consigo escrevê-los. Sempre crio pessoas pelas quais eu me apaixonaria, não necessariamente no sentido romântico. Mas pessoas que me encantariam, sabe? Pessoas para as quais eu daria longas olhadas na rua. Às vezes pelo andar engraçado ou pelo estilo de se vestir, até pela postura. Dou-lhes manias que gosto nos meus amigos, as que minha prima puxou da mãe, as que odeio no meu irmão, e manias que nunca vi na vida. 

Mas, por mais que não goste de uma ou outra característica deles, no grande plano das coisas, eu acabo sempre os adorando. Eles são sempre remediáveis, mesmo cometendo erro e estapafúrdia atrás de erro e estapafúrdia. Talvez isso tenha sido um erro. 

Não me lembro qual foi a última vez em que fui realmente longe com uma história. Normalmente crio mundos inteiros para empacar no primeiro ou segundo capítulo. Meus cadernos e hd de celular são basicamente uma Atlantis de histórias esquecidas. Bom, histórias interminadas. Lembro de praticamente todo personagem que já criei. E criar personagens, falar sozinho e ter muita imaginação é uma combinação perigosíssima, porque você realmente passa a habitar com todas essas outras pessoas dentro da cabeça, (e aí é impossível esquecê-las) e de repente o que era uma parte de você se recusa a fazer o que você quer que elas façam e tomam as rédeas e, quando você vê, elas estão realmente dando pitaco até na sua vida. Essas pessoas. Pessoas imaginárias. 

Escrever é um pouco como ficar louco. 

Acontece que, para meu horror, que sempre detestei nas fanfics, principalmente (afinal, foi onde comecei a escrever) as Claires, Annes, Kyles e Connors (você sabe, aqueles personagens mais toscos e unidimensionais possíveis de existir; AQUELES que nem chegam a um terço de pessoa de verdade e são apenas cópia da cópia uns dos outros, em cada história) estava escrevendo personagens tão pasteurizados quanto eles. 

Mas de um jeito diferente. Okay, eles são um pouco mais orgânicos que um Connor e uma Claire. Mas ainda assim, ultimamente tenho percebido que em várias de minhas histórias, os conflitos ou particularidades se assemelham; são quase todos artistas, quase todos deslocados, raramente hipócritas; e por aí vai. Raramente são filhos da puta sem ter uma história trágica de infância que os justifique, dificilmente são os vilões, a não ser que tudo no final acabe sendo um mal-entendido. 

Simplesmente odeio personagens como Gary e Mary Sue, mas acho que, para tentar correr deles o mais depressa possível, acabo esbarrando nas Clementines. Não a Clementine de O brilho eterno de uma mente sem lembranças, essa é especialmente incrível. 

De certa forma, às vezes eu sinto que estou escrevendo sempre as mesmas histórias de vários jeitos diferentes. 

E esse é um grande baque. Para qualquer escritor. Corremos disso como o diabo foge da cruz e, mesmo quando percebemos, não é uma coisa que admitamos, não até deixarmos isso BEM no passado (e falar sobre isso como um momento na história em um TedTalk ou algo assim, apenas quando já estamos bem melhores e podemos pensar "Nossa, dá para ACREDITAR que já fizemos isso? Tolinhos"). 

Então esta é uma ode aos meus personagens queridos. Vocês merecem muito mais do que eu tenho sido capaz de proporcionar. Vocês merecem ter suas histórias contadas. E, se eu vou criar pessoas que me façam ter vontade de virar o pescoço na rua para olhar, vocês merecem que as pessoas virem o pescoço na internet (e, quem sabe um dia, em estantes de livrarias) para olhar. 

E eu vou tentar sabe? Vou me esforçar por vocês. Eu os farei melhores. Bom, ou piores. Lhes darei mais defeitos, mais falhas de caráter e, que os padroeiros dos escritores me ajudem, decisões erradas para com vocês mesmos e as pessoas das suas vidas. Mas isso fará a história de vocês andar. Este será o pó de fada para vocês virem à vida. 

As histórias da minha vida raramente tem um desfecho, uma moral ou qualquer coisa que seja. Elas são sempre o pesadelo de todo leitor - um final estrondosamente aberto. Poucas coisas me irritam mais que isso. Portanto, é meu objetivo fazer a de vocês ser diferente. 


E se para história de vocês incendiar as páginas e as telas de quem estiver lendo, eu tiver que odiá-los, por mim tudo bem. 


2 comentários:

  1. Nos becos das esquinas da vida onde ninguém vê tem muita coisa que precisa ser contada. A mente humana é uma caixa de surpresa...
    O que é a loucura? loucura tem muitos pontos de vistas, principalmente dentro das culturas...
    E olhando bem de pertinho ninguém é totalmente são...
    Todos estamos atrás de desfechos para as nossas realidades a caminhada é a busca; mas com certeza para nós leitores é muito bom um desfecho kkkk.
    Adorei te ler...
    Desculpe a intromissão... te vi num blog que gosto bastante e resolvi te visitar...
    Prazer em conhecer;
    janicce.

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  2. Oi Summer! Prazer em conhece-la através dos blogs! Obrigada pela visita e comentário no meu cantinho cor de rosa, aliás gostei das cores de seu template. As coisas melhoraram por aqui, estamos voltando a vida normal. Vi que vc está retornando ao mundo dos blogs, bem vinda de volta! Quanto ao teu post...então você escreve!! Gostaria de ler seus escritos. Eu brinco de ser escritora no meu segundo blog "De Outro Mundo" caso vc queira ir lá conhecer...Boa semana! Um abraço! 😊

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